Ataques em escolas brasileiras nos últimos anos têm alarmado a sociedade e levantado questões sobre os fatores que podem estar influenciando o aumento desses atos violentos. Para entender melhor esses fenômenos, nosso sócio-diretor Dr. Thiago Fernando da Silva oferece uma análise crítica que destaca como determinados aspectos sociais e culturais têm contribuído para esse preocupante cenário. Essa análise está presente ao lado de outros especialistas no artigo “Ataque a escola em Cambé, no Paraná: por que casos se repetem? Especialistas listam 5 razões”, do Estadão, publicado em abril de 2023.
1. Avanço da Intolerância e Valorização da Cultura da Violência
Segundo Silva, a sociedade brasileira tem visto um aumento na “glamourização da violência” nos últimos anos. Esse fenômeno, que antes estava mais associado aos Estados Unidos, agora se espalha de maneira intensa pelo Brasil. Silva aponta que esse processo é especialmente perigoso porque cria um ambiente onde indivíduos vulneráveis, já predispostos a comportamentos violentos, podem ser ainda mais influenciados por discursos de intolerância e pelo fácil acesso a armas.
Essa "cultura da violência" tem impacto profundo em pessoas com funcionamento mental mais frágil, que se tornam alvos fáceis para esses estímulos negativos. A polarização social somada ao aumento de discursos extremistas contribui para um ambiente onde a violência não só é tolerada, mas também, em alguns casos, encorajada. Isso intensifica a predisposição de alguns indivíduos para cometerem atos violentos, como os recentes ataques em escolas.
2. Crescimento e Radicalização de Grupos de Ódio na Internet
Silva também discute sobre a crescente influência de grupos de ódio na internet, que se expandiram significativamente com o aumento do acesso às redes sociais. Ele observa que
“nessas comunidades de ódio, essas ideias têm eco, esses participantes se influenciam reciprocamente”,
criando um ciclo perigoso de radicalização entre os jovens. Esses grupos extremistas, que antes operavam em nichos mais fechados, agora ganham força e alcance amplificados pela tecnologia.
A normalização desses discursos de ódio na internet é especialmente prejudicial para os jovens, que estão em uma fase crucial de desenvolvimento psíquico e emocional. A exposição contínua a esses conteúdos pode levar à desumanização de outros grupos e ao fortalecimento de ideologias supremacistas, aumentando a probabilidade de que jovens influenciados por essas ideias cometam atos violentos.
3. Distanciamento nas Relações e Enfraquecimento do Afeto
O distanciamento nas relações interpessoais e o enfraquecimento do afeto também são fatores que, segundo Silva, contribuem para o aumento da violência entre os jovens. Ele relembra que
“nosso processo de desenvolvimento é modulado pela visão do outro”
e que o desgaste nas relações sociais e familiares tem levado as pessoas a buscarem refúgio nas redes sociais. Nessas plataformas, no entanto, muitos jovens acabam se deparando com conteúdos nocivos, incluindo ideologias extremistas.
Esse enfraquecimento dos laços afetivos dentro da família e em outras esferas sociais pode levar ao isolamento, o que, por sua vez, aumenta a vulnerabilidade dos jovens às influências negativas encontradas online. A falta de um suporte emocional sólido pode deixar esses jovens mais suscetíveis a comportamentos violentos, já que eles não desenvolvem adequadamente habilidades de empatia e resolução de conflitos.
4. Piora da Saúde Mental da Sociedade
A saúde mental da sociedade como um todo está em declínio, um fator diretamente relacionado ao aumento da violência, por conta do aumento dos comportamentos impulsivos e agressivos. E o uso de redes sociais também contribui com esse quadro, já que as pressões sociais e o estresse contínuo no contexto digital podem levar a uma piora significativa da saúde mental, aumentando a incidência de transtornos como depressão e ansiedade. Silva menciona que:
“Os mais jovens estão com o cérebro em formação. Os pais têm de tomar cuidado com o conteúdo que está sendo consumido, precisam estar juntos no processo de desenvolvimento Um dos melhores marcadores de saúde mental é o desenvolvimento de relações sociais saudáveis”
Um dos melhores marcadores de saúde mental é o desenvolvimento de relações sociais saudáveis, algo que está em risco na era digital. Uma maior regulamentação das plataformas tecnológicas é essencial para para mitigar esses efeitos negativos.
5. A Importância do Efeito Contágio
O efeito contágio é um fator crucial na proliferação de ataques violentos em escolas. Silva observa que
“esses indivíduos querem ser vistos, querem aparecer no jornal, na mídia”,
o que significa que a forma como a mídia cobre esses eventos pode influenciar outros indivíduos vulneráveis a cometerem atos semelhantes. A glamourização desses ataques na cobertura midiática pode, inadvertidamente, servir como um incentivo para que outros repitam tais atos.
“Dependendo de como o fato é divulgado, um indivíduo com um perfil de empatia menos desenvolvido pode se sentir validado por esse tipo de comportamento.”
É fundamental que a mídia adote uma abordagem mais controlada ao noticiar esses ataques, evitando a exibição de imagens dos incidentes e dos autores. Uma cobertura mais responsável pode ajudar a reduzir o impacto do efeito contágio e, consequentemente, diminuir a incidência de ataques futuros.
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